quinta-feira, 9 de junho de 2011

Refletindo no quebra-cabeça



A finalidade última de todas as ciências, filosofias e religiões é compreender o Eu, o Todo e a eterna relação do Eu com o Todo. Isso é , buscamos compreender as partes que integram o Todo e como tudo se relaciona.
Utilizamos diversas linguagens para descrever o Todo.
Iluminação seria ver a mesma essência em todas elas. Ver as coisas como elas realmente são. Perceber a realidade além da discrição.

Amar é servir e amar é dar sem nada de volta esperar.
Na natureza cada ser e cada elemento tem uma relação de servir com o outro. A vida é como uma grande teia onde tudo está conectado. 
Tudo se completa harmoniosamente. E tudo se desequilibra quando esse fluxo é interrompido.

Então se amar é servir. Se Deus é Amor e em tudo Deus está. Então podemos observar que a natureza é uma infinidade de formas servindo uma as outras por um propósito maior . A Vida do TODO! 

No sânscrito a palavra conhecimento é VIDYA(vida?) , e Ignorância é AVIDYA. Podemos então ver que onde há ignorância só existe morte, não-vida, sofrimento, ilusão e escuridão. 

Onde há conhecimento tem luz, tem alegria, liberdade, prazer  e podemos enxergar claramente as coisas. 

Agora olhem para o mundo e percebam a situação da Humanidade. Presos atrás dos muros e longe da natureza perdemos nossa identidade. Não conhecemos mais a nós mesmos, nem entendemos mais o Todo e nossa  relação. Estamos desprovidos de conhecimento(vidya) e por isso estamos sofrendo, estamos morrendo. A humanidade sofre, a humanidade morre. Fomos convencidos que somos apenas coisas que produzem coisas e consomem coisas. Nossos sonhos, vontades e desejos foram personificados em objetos. 
O mundo que deveria ser governado pelo amor agora é dominado por paixões humanas. Não queremos mais servir, buscamos apenas dominar e essa é a ilusão. Querer dominar o Todo sendo apenas uma parcela do Todo. Mas como o Todo pode caber nas mãos de suas partes?

Como o grande avatar uma vez disse ´´Conheceis a Verdade e elas vós libertará´´

Se termos conhecimento, seremos livres, pois conhecimento é vida e vida é o que todos querem. Apenas os tolos caminham alegremente em direção ao matadouro. Na ignorância nos desligamos da vida e da natureza e para sermos livres e felizes de novo precisamos restabelecer essa conexão(yoga) e religarmos o nosso Eu com a fonte original. 

Acho que estou começando a compreender...

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Mestre El Morya fala sobre a ´´Experiência Viva´´

 
 
No § 4: “Estribar-se em um “tipo de crença” pode indicar uma experiência vivente, mas também pode constituir, de outra parte, uma espécie de auto-hipnose ou uma “via de escape” para as dificuldades e os problemas da vida cotidiana. O esforço por compreender, por adquirir experiência, por experimentar e expressar o que se conhece e crê é, não raro, demasiadamente difícil para a maioria, e esta então se apóia em uma crença baseada no testemunho daqueles que inspirem confiança, como a forma mais fácil de sair do impasse.

O problema da religião e o do cristianismo ortodoxo não são uma e a mesma coisa. Grande parte da descrença e da crítica que nos circundam, como também a negação do que admitimos como verdades, se fundamenta no fato de que a religião foi substituída por um credo e a doutrina ocupou o lugar da experiência viva.”

Explicar as palavras dos Mestres é muito difícil. Cada pessoa entende de acordo com o seu próprio nível de consciência. Mas, como este momento nosso aqui é para uma conversa a respeito desse assunto, eu me vejo obrigada a falar alguma coisa.

Quando nós procuramos conhecer o Ensinamento de um Mestre, é porque esse Mestre e o Seu Ensinamento toca o nosso coração, e isso pode indicar uma experiência viva, que é o tema deste serviço de hoje. Mas não podemos deixar de refletir no motivo pelo qual estamos buscando esse Ensinamento. Será que estamos procurando resolver os nossos problemas pessoais?

Sabemos que a energia atraída para nós e para a nossa vida em geral, através do estudo desses Ensinamentos nos faz muito bem, resolve problemas. Precisamos saber se é isso mesmo o que queremos, ou se já estamos buscando a sintonia com a Luz, a Verdade, o Amor que podemos entender ser a Vida Verdadeira.

As vezes eu me pergunto: Carmen, você está no ciclo da semente ou da floração?


Para experimentar o Ensinamento é preciso desapego dos conceitos, desapego por tudo que aprendemos, até mesmo por parte daqueles a quem mais confiamos.
Por que? Porque o desapego nos dá liberdade de escolha e não ficamos restritos às informações recebidas, aos livros que conhecemos, e, sim, passamos a ouvir a nossa Voz Interna.

Também precisamos expandir o nosso campo de experiências, dinamizando tudo que aprendemos sem nenhum compromisso ou limitação externa. Com a disciplina diária da meditação, que significa, em verdade, sentir a ativa Presença de Deus, passamos à experiência Viva.

É mais trabalhoso porque tudo passa a depender de nós mesmos. A cada dia novas revelações chegam à nossa consciência e não conseguimos mais depender de religiões, livros, pessoas da nossa confiança, etc., porque estamos em sintonia com o nosso Ser Interno.

Há algum tempo, num momento de conflito, interno, fiz uma pergunta, mentalmente, ao Mestre Morya, e abri um de Seus livros. Me deparei com um parágrafo, que não me lembro agora o número, mas que dizia que não devemos rejeitar o que reconhecemos estar expandindo a nossa consciência. Isso me deu muita paz. Era isso mesmo o que eu queria saber naquele momento. A expansão é o resultado da experiência.

No § 163: “É a vida do Cristo, em todas as suas formas, que constitui o impulso evolutivo. É a vida do Cristo que torna possível a expressão da divindade, firmemente se revelando, no mundo natural. Está bem no fundo do coração de todo homem. A vida do Cristo leva-o finalmente ao ponto em que ele sai do reino humano (quando o trabalho da evolução normal fez sua parte) e o conduz para o reino do espírito.
(Não estou lendo o parágrafo todo; apenas o que achei mais importante para o momento)
(Continuando a leitura)
O Cristo vivo de todos os tempos, e vitalmente vivo hoje, é a chave da nova era, e sobre esta verdade deve ser construída a nova apresentação da religião e, mais tarde, constituída a nova teologia.
 
A verdadeira Igreja do Cristo é a reunião de todos os que vivem através da vida do Cristo e cuja vida seja una com a Sua. ....E compartilham com Ele na compreensão da natureza do serviço mundial. Este serviço mundial é tornado perfeito por aqueles cuja perfeição interna se aproxima da do Cristo e cujas vidas são controladas pelos mesmos impulsos divinos e subordinadas à mesma visão. Este estágio conota aquela completa liberdade espiritual que devemos finalmente alcançar.

No § 164: Agora chegou o tempo dos seres humanos abandonarem o crer e passarem ao verdadeiro conhecimento, por intermédio do método do pensamento, da reflexão, da experimentação, da experiência e da revelação. O problema imediato para todos aqueles que estão buscando este novo conhecimento e que desejam tornar-se conhecedores conscientes em vez de fiéis crentes, é que deverão alcança-lo no mundo do cotidiano. Após cada expansão de consciência e cada desenvolvimento de uma percepção aprofundada, nós voltamos, como o Cristo, à simplicidade do cotidiano e ali sujeitamos nosso conhecimento à prova, descobrimos sua realidade e verdade, e achamos também onde se encontra, para nós, o ponto de expansão seguinte e que novo conhecimento deve ser adquirido. A tarefa do discípulo é compreender e usar esta divindade. O conhecimento de Deus imanente, entretanto, baseado numa crença em Deus transcendente, é nosso empenho.

Esta foi a experiência dos apóstolos no alto da montanha. É-nos dito que “quando elevaram seus olhos, a ninguém viram mais, a não ser somente Jesus. O familiar reapareceu para eles. É realmente interessante comparar uma narrativa algo semelhante, relatada no Bhagavad Gita,(diz o Mestre Tibetano) em que a gloriosa forma do Senhor é revelada a Arjuna. No final da revelação, Deus, na pessoa de Krishna, lhe diz, com ternura e compreensão, “não deixes que o medo nem a confusão te dominem, por teres contemplado Minha forma tão terrível!
 
Vê, mais uma vez, minha forma anterior, sem temor, teu coração tranqüilo!” e depois prossegue, dizendo: “A forma em que me viste, ó príncipe! É tal, que a poucos é dado contempla-la. Os deuses, os arcanjos e os espíritos dos mais altos céus desejam ardentemente vê-la, mas não podem encarar-Me como tu Me encaraste. A esta visão não se chega pela leitura das Escrituras, nem por voluntários martírios, nem pela distribuição de esmolas ou sacrifícios. Só pelo verdadeiro amor e verdadeira devoção se pode chegar ao conhecimento do Meu Ser, e conhecer e ver e penetrar Minha essência.”


Não podemos esquecer: (Diz o Mestre) “A formação do caráter, a vida limpa, as reações emocionais controladas e o pensar correto, que são a base dos sistemas religiosos de todos os tempos e tão antigos que já perderam a significação. Não é fácil lembrar que ao vivermos pura e corretamente estamos de fato trabalhando com forças, subjugando energias às nossas necessidades; subordinando vidas elementais às exigências do ser espiritual.”

(Aos poucos o aspirante começa a despertar para novos estados de consciência que se revelam em seu viver diário, como retidão, coragem, paciência, tolerância, dignidade, ousadia, inofensividade, desapego e muitas outras virtudes ou energias da alma que vão substituindo os vícios ou tendências da personalidade.)

Saint Germain, em Seu Discurso nº 2, nos diz que Ele experimentou por muitos séculos essas instruções. Ele se refere aos Seus Discursos, mas, é claro, que de uma forma abrangente. Ele teve a experiência Viva dos Ensinamentos. Não foi só o conhecimento teórico, mas Ele experienciou tudo isso em Sua Vida prática e alcançou a Divindade, depois de muitos séculos.

Então, podemos ter esperança de chegarmos lá, também. Não pelo desejo de alcançar, porque no desejo não há ação, mas pela aspiração, que nos move para o Infinito.

Bibliografia:
Discursos do "Eu Sou" - Mestre Saint Germain
“De Belém ao Calvário" - Mestre Tibetano
 
“A Ioga, como ligação suprema com as consecuções cósmicas, existiu durante todas as épocas, Cada Ensinamento compreende sua própria Ioga, aplicável ao grau de evolução. As Iogas não se contradizem entre si: como ramos de uma árvore, estendem sua sombra e refrescam o viajante fatigado pelo calor.

Recuperadas as suas forças o viajante continua o caminho. Ele nada tirou que não lhe pertencesse, nem se desviou de sua aspiração. Ele aceitou a manifestação da graça do espaço, libertou as forças predestinadas e tomou posse de sua única propriedade.

Não eviteis as forças da Ioga; mas, como luz, deixe-as penetrar a penumbra do labor não conscientizado.

Para o futuro, nós despertamos do sono. Para o futuro, renovamos nossas roupagens. Para o futuro, nós nos alimentamos. Para o futuro, aspiramos em nosso pensamento. Para o futuro, reunimos forças.

Primeiramente, aplicaremos os conselhos da vida e depois, pronunciaremos o nome da Ioga vindoura. Ouviremos os passos do elemento do fogo, mas já estaremos preparados para dominar as ondulações das chamas.

Portanto, saudemos a Ioga mais antiga – a Raja Ioga – e afirmemos a futura – a Agni Ioga.”

(Agni Ioga – 1929)

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Doc: Morrendo por Não Saber!! Excelente!!

Max Gerson foi um médico alemão, que se radicou nos Estados Unidos devido ao Nazismo e a 2ª guerra mundial, e descobriu um tratamento holístico para cura do câncer através do uso de sucos de frutas orgânicas e através da desintoxição por inoculação de café orgânico (Terapia Gerson). Seu tratamento revolucionário curou centenas de pessoas no mundo todo e sua filha mais nova deu continuidade ao seu trabalho, através do Instituto Gerson e da criação de um Hospital em Tijuana, México.

O Hospital foi criado no México e não nos EUA por que as leis estadunidenses proíbem o tratamento do câncer por métodos que não sejam as técnicas invasivas e destruidoras da quimioterapia, radioterapia. Pessoas de todo mundo vão até o Hospital em Tijuana para curar-se e aprender a técnica curadora de Gerson, criando assim centros de cura em outras partes do mundo.

Gerson foi assassinado por envenenamento por arsênico, mas isso não impediu que sua obra fosse escrita e publicada, tornando-se a cura verdadeira para o mal do câncer. Mal maior certamente são aqueles que o assassinando queriam manter intocadas as bases da doença para auferir lucro com o sofrimento humano.

Esse documentário é imperdível e deve ser divulgado para todos aqueles que você ama e conhece, e não só para eles, mas para toda a humanidade que precisa libertar-se de uma medicina vergada sob o interesse das corporações farmacêuticas.



segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Está é a hora de uma nova partida

Agora você diz que cresceu,
que não se importa mais, que tudo morreu.
E deixa tomarem assim
o que lutamos tanto pra construir.
Consomem tudo o que acreditamos,
entopem as rádios de tudo que odiamos
e você aí parado reclamando
vê tudo ruir e diz não estar se importando.

Onde está você? Onde estou eu?
Será que vamos perder tudo o que amamos
por entre nossos dedos
sem resistir, sem mostrar que vivemos?
Será que ainda vê TODA FORÇA QUE TEMOS?

Posso ser tolo, mas meu coração
bate ainda a mesma canção.
E eu não vou me render a essa pilha de lixo,
a essa briga por restos, a essa gente feito bicho (Dance of Days)

domingo, 19 de dezembro de 2010

O Lobo da Estepe


O Lobo da Estepe vivia, segundo seu próprio entendimento, inteiramente à margem do mundo convencional, pois não conhecera nem a vida de família nem as ambições sociais. Sentia-se isolado ora como um esquisitão e doentio eremita, ora como um indivíduo superiormente dotado, que por seu gênio se sobressaía do comum dos mortais. Desprezava conscientemente a burguesia e vivia orgulhoso de não pertencer a ela. Contudo, sob muitos aspectos, vivia inteiramente como burguês, tinha dinheiro no banco, ajudava alguns parentes pobres, vestia-se sem cuidados particulares mas de maneira decente e sem chamar a atenção; procurava viver em paz com a polícia, os coletores de impostos e outros poderes semelhantes. Mas além disso sentia forte e secreta atração pela vida burguesa, pelas tranqüilas e decentes residências familiares com seus bem cuidados jardins, suas escadas reluzentes e sua modesta atmosfera de ordem e decoro. Agradava-lhe ter pequenos vícios e extravagâncias, sentir-se antiburguês, esquisitão ou gênio, mas nunca fixava residência onde não existisse nenhuma classe da burguesia. Não se encontrava à vontade em meio de pessoas violentas e atrabiliárias, nem entre delinqüentes e criminosos, mas antes procurava sempre viver em meio à classe média, com cujos hábitos, normas e atmosfera estava bem familiarizado, embora pudesse ter contra elas revolta e oposição. Além disso, fora educado em meio à pequena burguesia e dela conservara um grande número de idéias e noções. Teoricamente nada tinha em contrário à prostituição, mas na prática não seria capaz de levar uma prostituta a sério ou considerá-la realmente sua igual. Aos criminosos políticos, aos revolucionários ou aos sedutores espirituais, podia amá-los como se fossem seus irmãos, ou respeitar o estado e a sociedade, mas não saberia como tratar um ladrão, um criminoso ou sádico, a não se demonstrando por eles uma compaixão eminentemente burguesa.
Dessa forma sempre reconhecia e afirmava com uma parte de seu ser, por pensamentos ou atos, o que com a outra parte negava e combatia. Criado num lar burguês e culto, de moral firme, nunca chegara a libertar parte de sua alma desses convencionalismos, mesmo depois de haver-se individualizado na medida do possível dentro da burguesia e haver-se divorciado do conteúdo dos ideais e das crenças burguesas.
O “burguês”, como um estado sempre presente da vida humana, não é outra coisa senão a tentativa de uma transigência, a tentativa de um equilibrado meio-termo entre os inumeráveis extremos e pares de opostos da conduta humana. Tomemos, por exemplo, qualquer dessas dualidades, como o santo e o libertino, e nossa comparação se esclarecerá em seguida. O homem tem a possibilidade de entregar-se por completo ao espiritual, à tentativa de aproximar-se de Deus, ao ideal de santidade. Também tem, por outro lado, a possibilidade de entregar-se inteiramente à vida dos instintos, aos anseios da carne, e dirigir seus esforços no sentido de satisfazer seus prazeres momentâneos. Um dos caminhos conduz à santidade, ao martírio do espírito, à entrega a Deus. O outro caminho conduz à libertinagem, ao martírio da carne, à entrega, à corrupção. O burguês tentará caminhar entre ambos, no meio do caminho. Nunca se entregará nem se abandonará à embriaguez ou ao ascetismo; nunca será mártir nem consentirá em sua destruição, mas, ao contrário, seu ideal não é a entrega, mas a conservação de seu eu, seu esforço não significa nem santidade nem libertinagem, o absoluto lhe é insuportável, quer certamente servir a Deus, mas também entregar-se ao êxtase, quer ser virtuoso, mas quer igualmente passar bem e viver comodamente sobre a terra. Em resumo, tenta plantar-se em meio aos dois extremos, numa zona temperada e vantajosa, sem grandes tempestades ou borrascas, e o consegue ainda que à custa daquela intensidade de vida e de sentimentos que uma existência extremada e sem reservas permite. Viver intensamente só se consegue à custa do eu. Mas o burguês não aprecia nada tanto quanto o seu eu (um eu na verdade rudimentarmente desenvolvido). À custa da intensidade consegue, pois, a subsistência e a segurança; em lugar da posse de Deus cultiva a tranqüilidade da consciência; em lugar dos ardores mortais, uma temperatura agradável. O burguês é, pois, segundo sua natureza, uma criatura de impulsos vitais muito débeis e angustiosos, temerosa de qualquer entrega de si mesma, fácil de governar. Por isso colocou em lugar do poder a maioria, em lugar da autoridade a lei, em lugar da responsabilidade as eleições.
E compreensível que esta débil e angustiada criatura, embora existindo em número tão grande, não consiga manter-se, que, de acordo com suas particularidades, não possa representar outro papel no mundo senão o de rebanho de cordeiro entre lobos erradios. Contudo, vemos que, em tempos de governos fortes, os burgueses se vêem oprimidos contra a parede, mas nunca sucumbem; na verdade às vezes parecem mesmo dominar o mundo. Como será possível? Nem o numeroso rebanho, nem a virtude, nem o senso comum, nem a organização serão suficientes para salvá-lo da destruição. Não há remédio no mundo que possa sustentar uma intensidade tão débil em sua origem. E, todavia, a burguesia vive, é forte e próspera. Porquê?
A resposta é a seguinte: Por causa dos lobos da estepe. Com efeito, a força vital da burguesia não se apóia de maneira alguma nas particularidades de seus membros normais, porém nas dos extraordinários e numerosos outsiders2 que, em conseqüência, a querem rodear com a vaga indecisão e a elasticidade de seus ideais. Convivem sempre na burguesia uma grande multidão de naturezas fortes e selvagens. Nosso Lobo da Estepe, Harry, é um exemplo característico. Ele que se desenvolveu muito mais do que se espera de um burguês, ele que conhece as delícias da meditação e também as sombrias alegrias do ódio e do ódio contra si mesmo, ele que despreza a lei, a virtude, o senso comum, é, no entanto, um prisioneiro forçado da burguesia e não pode escapar a ela. E assim em torno do núcleo da burguesia se sobrepõem amplas camadas de Humanidade, muitos milhares de vidas e inteligências, cada uma das quais surgida certamente da burguesia e disposta a uma vida sem reservas, mas que continua dependente da burguesia por sentimentos infantis e um tanto contagiada em sua debilidade pela intensidade vital; e embora pertencendo a ela, obrigadas e a seu serviço, pois à burguesia assenta perfeitamente o contrário da máxima do Grande: “Quem não está contra mim, está comigo.”
Se examinarmos agora a alma do Lobo da Estepe, veremos que ele é distinto do burguês por causa do alto desenvolvimento de sua individualidade, pois toda a individualização superior se orienta para o egoísmo e propende portanto ao aniquilamento. Vemos que tem em si um forte impulso tanto para o santo quanto para o libertino; no entanto, não pode tomar o impulso necessário para atingir o espaço livre e selvagem, por debilidade ou inércia, e permanece desterrado na difícil e maternal constelação da burguesia. Esta é sua situação no espaço do mundo e sua sujeição. A maior parte dos intelectuais e dos artistas pertence a esse tipo. Só os mais fortes entre eles ultrapassam a atmosfera da terra da burguesia e logram entrar no espaço cósmico; todos os demais se resignam ou selam pactos, pertencem a ela, reforçam-na e glorificam-na, pois em última instância têm de professar sua crença para viver. A vida desse infinito número de pessoas não atinge o trágico, mas apenas um infortúnio considerável e uma desventura, em cujo inferno seus talentos engendram e frutificam. Os poucos que se libertaram buscam sua recompensa no absoluto e sucumbem no esplendor. São os trágicos e seu número é pequeno. Mas os outros, os que permaneceram submissos, a cujo talento a burguesia concede com freqüência grandes homenagens, a estes se abre um terceiro reino, um mundo imaginário, mas soberano: o humor. Os inquietos lobos da estepe, a esses contínuos e terríveis pacientes, ao que está negado o apoio necessário para o trágico, para subir ao espaço sideral, que se sentem chamados para o absoluto e, no entanto, não podem nele viver; para esses, quando seu espírito se fez duro e elástico na dor, abre-se-lhes o caminho conciliante do humor. O humor é sempre um pouco burguês, embora o verdadeiro burguês seja incapaz de compreendê-lo. Em suas imaginárias esferas realiza-se o ideal intrínseco e multifacetado de todos os lobos da estepe: aqui é possível não apenas celebrar o santo e o libertino ao mesmo tempo e unir um pólo ao outro, mas também incluir os burgueses na mesma afirmação. É possível estar-se possuído por Deus e sustentar o pecador, e vice-versa, mas não é possível nem ao santo nem ao libertino (nem a nenhum outro absoluto) afirmar aquele meio-termo fraco e neutro que se chama burguês. Somente o humor, a magnífica descoberta dos que foram detidos em seu vôo para o mais alto, dos quase trágicos, dos infelizes superdotados, só o humor (talvez o produto mais genuíno e genial da Humanidade) atinge esse impossível e une todos os aspectos da existência humana nos raios de seu prisma. Viver no mundo como se não fosse o mundo, respeitar a lei e no entanto colocar-se acima dela, possuir uma coisa “como se não a possuísse”, renunciar como se não tratasse de uma renúncia, todas essas proposições favoritas e formuladas com freqüência, todas essas exigências de uma alta ciência da vida, somente pode realizá-las o humor.
E no caso do Lobo da Estepe, a quem não faltam faculdades e disposições para tanto, se lograsse, no labirinto de seu inferno, absorver e transpirar essa bebida mágica, então estaria salvo. Ainda lhe falta muito para isso, mas a possibilidade, a esperança existem. Quem o ama, quem se interessa por ele, pode desejar-lhe esta salvação. Ela iria, é verdade, mantê-lo preso ao mundo burguês, mas seu padecimento seria suportável e produtivo. Suas relações com o mundo burguês quer no amor quer no ódio perderiam seu sentimentalismo e sua sujeição a ele cessaria de atormentá-lo continuamente como um opróbio.
Para alcançar isto, ou para, afinal, ser capaz de tentar o salto no desconhecido, teria um lobo da estepe de defrontar-se algumas vezes consigo mesmo, olhar profundamente o caos de sua própria alma e chegar à plena consciência de si mesmo. Sua existência enigmática revelar-se-ia então para ele em toda sua invariabilidade e ser-lhe-ia impossível para sempre no futuro escapar do inferno de seus impulsos e refugiar-se em consolos filosóficos e sentimentais. Seria necessário que o homem e o lobo se conhecessem mutuamente sem falsas máscaras sentimentais, que se fitassem nos olhos em toda a sua nudez. Então explodiriam ou se separariam para sempre, de modo que não voltariam a existir lobos da estepe ou chegariam a bons termos à luz nascente do humor.
É possível que Harry tenha um dia esta última possibilidade. É possível que um dia aprenda a conhecer-se, seja porque receberá nas mãos um dos nossos espelhinhos, seja porque alcance o Imortal ou talvez encontre num dos nossos teatros mágicos aquilo de que necessita para libertar sua alma desgarrada. Mil possibilidades o esperam, seu destino as atrai irremediavelmente, pois todos esses solitários da burguesia vivem na atmosfera dessas mágicas possibilidades. Basta apenas um nada para que se produza a centelha.
E tudo isso é amplamente conhecido pelo Lobo da Estepe, ainda que seus olhos nunca venham a dar com este fragmento de sua biografia íntima. Ele suspeita e teme a possibilidade de um encontro consigo mesmo, e está cônscio da existência daquele espelho no qual tem uma necessidade tão marga de olhar-se e no qual teme mortalmente ver-se refletido.
Para terminar nosso estudo resta esclarecer ainda uma última ficção, um engano fundamental. Todas as interpretações, toda psicologia, todas as tentativas de tornar as coisas compreensíveis se fazem por meio de teorias, mitologias, de mentiras; e um autor honesto não deveria furtar-se, no fecho de uma exposição, a dissipar essas mentiras dentro possível. Se digo “acima” ou “abaixo”, isso já é uma afirmação, que exige um esclarecimento, pois só existem acima e abaixo no pensamento, na abstração. O mundo mesmo não conhece nenhum acima nem abaixo.
Da mesma maneira, para ser sucinto, o lobo da estepe também é uma ficção. Se o próprio Harry se sente como homem-lobo e se crê formado por dois seres inimigos e opostos, isso é puramente uma mitologia simplificadora. Harry não é nenhum homem-lobo, e se aceitamos a princípio sua mentira, inventada e acreditada por ele mesmo, e tentamos considerá-lo e explicá-lo dentro da realidade como um ser duplo, como um lobo da estepe, foi porque nos aproveitamos dela para sermos compreendidos mais facilmente, mentira essa cuja retificação deve ser tentada agora.
A divisão em lobo e homem, em impulso e espírito, mediante a qual Harry procura explicar seu destino, é uma grosseira simplificação, uma violentação do real em favor de uma explicação plausível porém errônea da desarmonia que este homem encontra em si e que lhe parece a fonte de seus não leves sofrimentos. Harry encontra em si um “homem”, ou seja, um mundo de pensamentos, de sensações, de cultura, de natureza domada e sublimada, e vê também, ao lado de tudo isto, um “lobo”, ou seja, um obscuro mundo de instintos, de selvagerismo e crueldade, de natureza bruta e insublimada. Apesar desta divisão, ao que tudo indica tão clara de seu ser em duas esferas, que são inimigas entre si, de quando em quando, já percebeu que o lobo e o homem, durante algum tempo, vivem reconciliados. Se Harry tentasse estabelecer em cada momento determinado de sua vida, em cada um de seus sentimentos, a parte correspondente neles ao homem e a parte que corresponde ao lobo, acabaria por encontrar-se num dilema, e toda a sua bela teoria do homem-lobo cairia por terra. Pois não há um único ser humano, nem mesmo o negro primitivo, nem mesmo os idiotas, convenientemente simples, que possa ser explicado como a soma de dois outros elementos principais; e explicar um homem tão complexo quanto Harry por meio da ingênua divisão em lobo e homem seria uma tentativa positivamente infantil. Harry compõe-se não de dois, mas de cem ou de mil seres. Sua vida não oscila (como a vida de cada um dos homens) simplesmente entre dois pólos, tais como o corpo e o espírito, o santo e o libertino, mas entre mil, entre inumeráveis pólos.
Não devemos surpreender-nos pelo fato de que mesmo um homem tão inteligente e educado quanto Harry possa tomar-se por um lobo da estepe e reduzir a rica e complexa imagem de sua vida a uma fórmula tão simples, tão rudimentar e primitiva. O homem não é capaz de pensar em alta escala, e mesmo o mais espiritual e altamente intelectualizado pode contemplar o mundo e a si próprio através das lentes de fórmulas enganosas e simplistas – especialmente a si próprio! Pois parece ser uma necessidade inata e imperativa de todos os homens imaginarem o próprio ser como uma unidade. E apesar de essa ilusão sofrer com freqüência graves contratempos e terríveis choques, ela sempre se recompõe. O juiz que se senta defronte ao criminoso e o fita no rosto, e por um instante reconhece todas as emoções, potencialidades e possibilidades do assassino em sua própria alma de juiz e ouve a voz do assassino como sendo a sua, já no momento seguinte volta a ser uno e indivisível como juiz, volta a encerrar-se na envoltura do seu eu quimérico e cumpre seu dever e condena o assassino à morte. E se em algumas almas humanas, singularmente dotadas e de percepção sensível, se levanta a suspeita de sua composição múltipla, e, como ocorre aos gênios, rompem a ilusão da unidade personalística e percebem que o ser se compõe de uma pluralidade de seres como um feixe de eus, e chegam a exprimir essa idéia, então imediatamente a maioria as prende, chama a ciência em seu auxílio, diagnostica esquizofrenia e protege a Humanidade para que não ouça um grito de verdade dos lábios desses infelizes. Então, para que perder aqui palavras, por que expressar coisas que todos aqueles que pensam conhecem por si mesmos, quando sua simples enunciação é uma nota de mau gosto? Assim, pois, se um homem se aventura a converter numa dualidade a pretendida unidade do eu, se não é um gênio, é em todo caso uma rara e interessante exceção. Mas na realidade não há nenhum eu, nem mesmo no mais simples, não há uma unidade, mas um mundo plural, um pequeno firmamento, um caos de formas, de matizes, de situações, de heranças e possibilidades. Cada indivíduo isolado vive sujeito a considerar esse caos como uma unidade e fala de seu eu como se fora um ente simples, bem formado, claramente definido; e a todos os homens, mesmo aos mais eminentes, esse rude engano parece como uma necessidade, uma exigência da vida, como o respirar e o comer.
O equívoco reside numa falsa analogia. Todo homem é uno quanto ao corpo, mas não quanto à alma. Também na literatura, mesmo na mais refinada, encontramos este conceito habitual em personagens aparentemente unas, aparentemente uniformes. No teatro de hoje, o que mais aprecia a gente do ofício, os conhecedores, é o drama, e com razão, pois oferece (ou oferecia) as maiores possibilidades para a representação do eu como uma pluralidade, se isto não se opõe a brutal impressão de unidade que nos dá cada pessoa isolada do drama, ao levar encerrada, sem resistência, essa pluralidade num corpo simples, uniforme e isolado. Também apreciam muito a ingênua estética do chamado drama de caráter, no qual cada figura se apresenta como uma unidade muito característica e isolada. Só de longe e pouco a pouco começa a despertar em alguns a suspeita de que tudo isto não passa de uma razoável estética superficial, de que nos equivocaremos se aplicarmos aos nossos grandes dramaturgos a magnífica idéia de beleza dos antigos, pois esta não é congênita a nós, mas simplesmente intuída, e é nela, na fonte comum dos corpos visíveis, que se encontra exatamente a ficção do ego, da personalidade. Nas obras da Índia antiga esta concepção é completamente desconhecida, os heróis da epopéia índica não são pessoas, mas aglomerados de pessoas, conjuntos de reencarnações. E em nosso mundo moderno há obras em que, por trás do véu do jogo das pessoas e caracteres, tentou-se apresentar uma pluralidade de almas, não de todo inconsciente para o autor. Quem queira comprovar isto deve decidir-se a considerar de uma vez as figuras de uma obra semelhante, não como seres individuais, mas como pares, como facetas, como aspectos diversos de uma suprema unidade (que para mim é a alma do poeta). Quem examinar deste modo o Fausto, tanto o Fausto, Mefistófeles, Wagner e todos os demais significarão para ele a unidade, uma superpessoa, e só nesta suprema unidade e não nas figuras isoladas estará refletido algo da verdadeira essência da alma. Quando fausto diz a frase que ficou célebre entre os professores e admirada com terror pelos filisteus: “Duas almas, ai, moram no meu peito!” esqueceu-se de Mefistófeles e de toda uma multidão de outras almas que também se abrigam em seu peito. Nosso Lobo da Estepe crê levar também em seu peito duas almas (lobo e homem) e por isto sente o peito demasiadamente oprimido e estreito. O peito, o corpo, é sempre uno, mas as almas que nele residem não são nem duas, nem cinco, mas incontáveis, o homem é um bulbo formado por cem folhas, um tecido urdido com muitos fios. Os antigos asiáticos sabiam disto muito bem, e encontram no ioga búdico uma técnica precisa para descobrir a ilusão da personalidade. Divertido e multíplice é o jogo da Humanidade: a ilusão que levou milhares de anos para ser descoberta pelos hindus é a mesma ilusão que aos ocidentais custou tanto trabalho custodiar e fortalecer.
Se observarmos o Lobo da Estepe a partir deste ponto de vista, veremos claramente porque sofre tanto sob a sua ridícula dualidade. Crê, como Fausto, que duas almas são demais pra um peito só e podem arrebentar com ele. Mas, ao contrário, são demasiado poucas, e Harry violenta terrivelmente sua pobre alma se busca compreendê-la numa imagem tão primitiva. Harry, embora seja um homem grandemente instruído, procede talvez como um selvagem, que não sabe contar além de dois. Chama a uma parte de si mesmo de homem, à outra, de lobo, e com isso acredita haver chegado á meta e esgotado o assunto. No “homem” encerra tudo o que há de espiritual, de sublime ou culto que encontra em si, e no “lobo” tudo o que há de instintivo, de selvagem e caótico. Mas as coisas não se passam na vida de maneira tão simples como em nosso pensamento, nem tão rude como em nosso pobre idioma de idiotas, e Harry se engana duplamente ao empregar este método tacanho do lobo. Harry considera, o que é de temer-se, todas as divisões de sua alma como parte do “homem”, muitas das quais já deixaram de ser homem, e qualifica partes de seu ser como lobo, partes que há muito já estão além do lobo.
Como todos os homens, Harry crê saber muito bem o que é o homem, e não sabe absolutamente nada, embora o suspeite algumas vezes em sonho ou em outros estados anímicos não sujeitos a controle. Quem dera não esquecesse esses pressentimentos, mas se apropriasse deles tanto quanto possível! O homem não é uma forma fixa e duradoura (tal era o ideal dos antigos, apesar do pensamento em contrário de alguns luminares da época); é antes um ensaio e uma transição, não é outra coisa senão a estreita e perigosa ponte entre a Natureza e o Espírito. Para o espírito, para Deus, ele é impulsionado por sua vocação mais íntima. para a natureza, para a mãe, é atraído pelo mais íntimo desejo. Sua vida oscila vacilando angustiosamente entre ambos os poderes. O que se compreende comumente pela palavra “homem” é sempre uma estipulação efêmera e burguesa. Certos impulsos mais crus estão afastados e proibido nessa convenção; um grau de consciência e de cultura humana são reclamados à besta; uma pequena parcela de espírito não é somente permitida, como também encorajada. O homem desta convenção, como todos os outros ideais burgueses, é uma conciliação, um intento tímido, de ingênua astúcia com o intuito de enganar tanto à perversa mãe Natureza primitiva quanto o incômodo primitivo pai Espírito de suas enérgicas exigências e para viver na zona temperada entre eles. É por isso que a média das pessoas permite e tolera aquilo que denomina “personalidade”, mas ao mesmo tempo entrega a personalidade àquele Moloch chamado “Estado” e intriga continuamente um com o outro. Assim o burguês queima hoje por herege e enforca por criminoso aquele ao qual amanhã levantará estátuas.
Que o “homem” não é alguma coisa já criada, mas apenas uma exigência do espírito, uma possibilidade longínqua, tão desejada quanto temida, e que o caminho a que isto conduz só vai sendo percorrido em pequenos impulsos e debaixo de terríveis tormentos e sonhos, precisamente por aquelas raras individualidades, para as quais hoje se prepara o patíbulo e amanhã o monumento – é a suspeita que vive também no Lobo da Estepe. Porém, o que ele para si designa como “homem”, em contraposição ao seu “lobo”, não é, em grande parte, senão aquele homem medíocre do convencionalismo burguês. O caminho para o verdadeiro homem, o caminho para os imortais, Harry adivinha-o perfeitamente e percorre-o também aqui e ali com timidez, muito lentamente, pagando este avanço com graves tormentos e com seu doloroso isolamento. mas, proporcionar-se, aspirar àquela suprema exigência, àquela encarnação pura e buscada pelo espírito, andar o único caminho estreito para a imortalidade, isto receia-o no mais profundo de sua alma. tem perfeita consciência de que isto conduz a tormentos ainda maiores, à proscrição, à renúncia de tudo, talvez ao cadafalso; e, apesar de saber que no fim deste caminho a imortalidade sorri sedutora, não está disposto a padecer todos estes sofrimentos, a morrer todas estas mortes. Tendo ainda mais consciência do fim da encarnação do que os burgueses, fecha, todavia, os olhos e faz por ignorar que o apego desesperado ao próprio eu, a desesperada ânsia de viver, são o caminho mais seguro para a morte eterna, ao passo que o saber morrer, rasgar o véu do mistério, ir procurando eternamente mutações em si mesmo, conduz à imortalidade. Quando adora os seus favoritos entre os imortais, Mozart, por exemplo, nunca o faz, afinal, senão com olhos de burguês, e pretende explicar doutamente a perfeição de Mozart apenas pelos seus altos dotes de músico, e não pela grandeza de sua abnegação, paciência no sofrimento e independência perante os ideais da burguesia, pela sua resignação naquele extremo isolamento, semelhante ao do horto de Getsêmani, que em torno do que sofre e está em vias de reencarnação rarifica toda a atmosfera burguesa até convertê-la em gelado éter cósmico.
Mas, enfim, o nosso Lobo da Estepe descobriu dentro de si ao menos a duplicidade fáustica; conseguiu determinar que à unidade de seu corpo corresponde uma unidade espiritual, mas que, no melhor dos casos, apenas se encontra em caminho, com uma larga peregrinação à frente, para o ideal dessa harmonia. Desejaria vencer dentro de si o lobo e viver inteiramente como homem, ou então, renunciar ao homem e viver ao menos como lobo uma vida uniforme, sem desvios. Provavelmente nunca observou com atenção um lobo autêntico; então veria, talvez, que nem mesmo os animais possuem a anuidade da alma, que também neles, atrás da bela e austera forma do corpo, vive uma multiplicidade de desejos e de estados; que também o lobo tem abismos no seu interior e também sofre. Não! Com a volta à Natureza o homem vai sempre por um falso caminho, cheio de sofrimentos e sem esperanças. Harry não pode tornar a converter-se inteiramente em lobo, e se tal acontecesse veria que nem mesmo o lobo é simples e originário, mas alguma coisa já muito complexa. Também o lobo tem duas e mais de duas almas dentro do peito, e quem desejar ser um lobo incorre na mesma ignorância do homem da canção: “Feliz quem voltasse a ser criança!” O homem simpático, mas sentimental, que entoa a canção do menino ditoso, desejaria também voltar à Natureza, à inocência, ao princípio, mas esqueceu que nem mesmo as crianças são felizes, e sim suscetíveis de muitos conflitos, de muitas desarmonias, de todos os sofrimentos.
Para trás, não conduz a nenhum caminho, nem para o lobo nem para a criança. No princípio das coisas não há simplicidade nem inocência; tudo o que foi criado até o que parece mais simples, é já culpável, já complexo, foi lançado ao sujo torvelinho do desenvolvimento e já não pode, não poderá nunca mais, nadar contra a corrente. O caminho para a inocência, para o incriado, para Deus, não se dirige para trás mas sim para diante; Não para o lobo ou a criança, mas cada vez mais para a culpa, cada vez mais fundamente dentro da encarnação humana. Nem mesmo com o suicídio, pobre Lobo da Estepe, te livrarás realmente das dificuldades; tens de percorrer o caminho mais largo, mais penoso e mais difícil da humana encarnação; freqüentemente terás de multiplicar a tua multiplicidade, complicar ainda mais a tua complexidade. Em vez de reduzir o teu mundo, de simplificar a tua alma, terás de recolher cada vez mais mundo, de recolher no futuro o mundo inteiro na tua alma dolorosamente dilatada, para chegar talvez algum dia ao fim, ao descanso. O mesmo caminho foi percorrido por Buda e todos os grandes homens, uns conscientes, outros inconscientemente, na medida em que a fortuna favorecia a sua busca. Nascimento significa desunião do todo, limitação, afastamento de Deus, penosa reencarnação. Volta ao todo, anulação da dolorosa individualidade, chegar a ser Deus, quer dizer: ter dilatado a alma de tal forma que se torne possível voltar a conter novamente o todo.
Não se trata aqui do homem conhecido das escolas, da economia política ou da estatística, nem do homem que aos milhões anda pela rua e não tem mais importância do que a areia ou a espuma dos mares: pouco adiantam alguns milhões a mais ou a menos; são material e nada mais. Não, nós falamos aqui do homem no sentido elevado do termo, do largo caminho da encarnação humana, do homem verdadeiramente real, dos imortais. O gênio não é tão raro como em geral nos parece, nem tão freqüente como pretendem as histórias literárias, a história universal e até mesmo os jornais. O Lobo da Estepe, Harry, segundo nossa opinião, seria gênio bastante para intentar a aventura da encarnação humana, sem necessidade de trazer para confrontação, lamentavelmente, a cada dificuldade, o seu estúpido lobo da estepe.
É tão estranho e entristecedor que homens de tais possibilidades surjam como lobos da estepe e com “duas almas, ai!” e que mostrem tanta afeição covarde ao burguês. Um homem capaz de compreender Buda, um homem que tem noção dos céus e dos abismos da natureza humana, não deveria viver num meio em que domina o senso comum, a democracia e a educação burguesa. Só por covardia continua a viver nele, e quando suas dimensões o oprimem, quando a estreita cela do burguês se torna demasiado apertada, ele atribui tudo isto ao “lobo” e não que aperceber-se de que às vezes o lobo é a sua melhor parte. Tudo o que há de feroz dentro de si ele o atribui ao lobo e o tem por mau, perigoso e terror dos burgueses; mas ele que, no entanto, se acredita um artista e supõe ter sensibilidade, não é capaz de ver que fora do lobo, atrás do lobo, vivem no seu interior muitas outras coisas: que nem tudo o que morde é lobo; que dentro de si habitam também a raposa, o dragão, o tigre, o macaco e a ave-do-paraíso, e que todo este mundo é um éden cheio de milhares de seres, formosos e terríveis, grandes e pequenos, fortes e delicados, mundo asfixiado e cercado pelo mito do lobo – tanto como o verdadeiro homem que nele há é asfixiado e preso apenas pela sua aparência de homem, pelo burguês.
Imagine-se num jardim de cem espécies de árvores, com mil variedades de flores, com cem espécies de frutas e outros tantos gêneros de ervas. Pois bem: se o jardineiro que cuida deste jardim não conhece outra diferenciação botânica além do “joio” e do “trigo”, então não saberá que fazer com nove décimas partes de seu jardim, arrancará as flores mais encantadoras, cortará as árvores mais nobres, ou pelo menos ter-lhes-á ódio e as olhará com maus olhos. Assim faz o Lobo da Estepe com as mil flores de sua alma. O que não está compreendido na designação pura e simples de “lobo” ou de “homem nem sequer merece sua atenção. E quantas qualidades ele empresta ao homem! Tudo o que é covarde, símio, estúpido, mesquinho, desde que não seja muito, diretamente lupino, ele atribui ao “homem”, assim como atribui ao “lobo” tudo o que é forte e nobre, só porque não conseguiu ainda dominá-lo.
Despedimo-nos de Harry. Deixamos que continue o seu caminho. Se já estivesse com os imortais, se já tivesse chegado lá onde a sua penosa marcha parece querer levá-lo, como olharia assombrado este vaivém, este feroz e irresoluto ziguezague da sua rota, como sorriria a este lobo da estepe, animando-o, censurando-o, com compaixão e complacência!


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Quando os assassinos do Rei estão a solta, mil magos surgem na Terra...

domingo, 14 de novembro de 2010

Meditando




Preciso equilibrar as energias que esse mundo emana sobre mim. Existem diversos caminhos que levam ao mesmo fim, preciso aprender a lidar com a ilusão e as paixões mundanas e descobrir como realmente sentir a vida que há dentro do meu ser. Os objetos de ''gozo dos sentidos'' tornam-se cada vez menos sedutores e começo a refletir que os aspectos externos de felicidade temporária já não me completam.

Sabedoria é necessária para viver em harmonia com aqueles que ainda dormem. Sabendo bem que não estou situado acima de nenhum pedestal e não sou melhor que ninguém. Estou apenas tentando ouvir a voz que vem do meu interior. Meu espírito quer transpor os limites que o condicionamento de uma sociedade profundamente doente impôs sobre a minha natureza.

Sinto saudade ao olhar para o céu e fico imaginando o que me aguarda. Desde a infância pensamentos sobre o mundo que me cerca me intrigam , algo dentro de mim dizia que algo estava errado , mas externamente recebia ondas de (des)informações que buscavam conter e apagar aquela voz em mim.

Vim como um espirito rebelde que não queria aceitar as coisas como eram. Observo as pessoas e essa sociedade que vivo e pressinto que tudo irá acabar no abismo. Passei por crises de identidade que me fizeram mergulhar em diversas realidades alternativas, buscava idéias e culturas diversificadas como forma de me diferenciar da sociedade que vivo. O padrão de ser normal e de sempre fazer as mesmas coisas é uma forma de gaiola que aprisiona a criatividade humana, deixando o melhor do ser humano de lado. Dessa maneira destruiram a poesia da vida e a magia do Ser, o inimigo quis calar o Deus que vive dentro de cada ser vivo.

Sou um buscador da Verdade,  quero me empolgar com coisas belas, puras e reais, quero ser Humano e por isso me recuso a me submeter a tirania! E a minha alma veio a esse mundo para trazer novas visões de mundo, acabar com tantar mentiras e quebrar os paradigmas que mantém o medo e a escuridão. E sei que outros como eu estão buscando o mesmo caminho e é questão de tempo para que esses(as) filhos(as) da Luz encontrem-se.

Nunca desista dos seus sonhos.



quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Mãe Terra




Abençoado seja o Filho(a) da Luz que conhece sua Mãe Terra

Pois é Ela a doadora da vida

Saibas que a sua Mãe Terra está em ti e tu estás Nela

Foi Ela quem te gerou e que te deu a vida

E te deu este corpo que um dia tu lhe devolverás

Saibas que o sangue que corre nas tuas veias

Nasceu do sangue da tua Mãe Terra

O sangue Dela cai das nuvens, jorra do ventre Dela

Borbulha nos riachos das montanhas

Flui abundantemente nos rios das planícies

Saibas que o ar que respiras nasce da respiração da tua Mãe Terra

O alento Dela é o azul celeste das alturas do céu

E os sussurros das folhas da floresta

Saibas que a dureza dos teus ossos foi criada dos ossos de tua Mãe Terra

Saibas que a maciez da tua carne nasceu da carne de tua Mãe Terra

A luz dos teus olhos, o alcance dos teus ouvidos

Nasceram das cores e dos sons da tua Mãe Terra

Que te rodeiam feito às ondas do mar cercando o peixinho

Como o ar tremelicante sustenta o pássaro

Em verdade te digo, tu és um com tua Mãe Terra

Ela está em ti e tu estás Nela

Dela tu nasceste, Nela tu vives e para Ela voltará novamente

Segue portanto as suas leis

Pois teu alento é o alento Dela

Teu sangue, o sangue Dela

Teus ossos, os ossos Dela

Tua carne, a carne Dela

Teus olhos e teus ouvidos são Dela também

Aquele que encontra a paz na sua Mãe Terra

Não morrerá jamais

Conhece esta paz na tua mente

Deseja esta paz ao teu coração

Realiza esta paz com o teu corpo.

Evangelho dos Essênios